Agosto, mês do desgosto

Você já ouviu esse dizer acima?

Na pesca artesanal do Paraná é muito comum ouvirmos das pescadoras e pescadores essa referência ao mês de agosto. Isso porque tradicionalmente este é um mês de dificuldades na pesca: são poucos dias de pescaria, e, nesses dias, geralmente poucas capturas de pescado.

E não é uma lenda popular, faz muito sentido! E vamos te explicar porque, com 3 motivos principais:

1 - Influência das Marés

No período de agosto a setembro estamos próximos do equinócio da primavera, e por conta da atração gravitacional nessa relação da posição do Sol com o Planeta Terra, temos marés muito altas.

Com essa intensidade das marés, ocorre o que os pescadores chamam de "força de maré", que atrapalha muito a pescaria com redes, já que elas embolam na tentativa de capturar um cardume, ou se deslocam grandes distâncias quando deixadas no mar de um dia para o outro.

Como se não bastasse essa influência, as marés mais fortes desse período também podem sofrer duas influências: as fases da lua, e a condição meteorológica. Se já sabemos que em agosto e setembro temos tendência a marés fortes, imagina quando somamos essa condição a uma semana de lua cheia ou lua nova? Esse efeito se potencializa.

E como se não bastasse, a meteorologia também vai influenciar…

2 - Ventos fortes e frequentes

Neste mês também é muito comum vermos o tempo instável, com mudanças bruscas de temperatura no Paraná. Além disso, é comum no litoral termos semanas inteiras de ventos fortes, sobretudo vento sul (trazendo frente fria).

Com esses vários dias e ventos (correspondendo geralmente a metade do mês ou até mais), o mar também fica agitado e o risco na navegação e uso de redes no mar se torna muito alto, fazendo com que os pescadores prefiram ficar em casa. Com essa decisão, eles deixam de obter renda na pesca, mas ao mesmo tempo evitam o risco de terem prejuízo com perda de redes, embarcação estragada ou até mesmo risco de vida à tripulação.

3 - Período entressafra

Em agosto, por entrarmos num período de final dos dias mais frios e início dos dias mais quentes, também percebemos essa dinâmica na temperatura das águas. Dessa forma, é comum que espécies de pescados com safra no inverno (com águas mais frias, como tainha, linguado, camarão branco) comecem a deixar de aparecer na costa do Paraná, ao mesmo tempo que as espécies de águas mais quentes (como peixe porco, salteira, bagre, paru) ainda não estão ocorrendo em nosso litoral.

Assim, agosto se torna um mês de muita incerteza e pouca captura de pescados pelas comunidades de pesca artesanal do Paraná. Isso reflete diretamente na renda dos pescadores nesse período: se não tiveram boas capturas de cavala e tainha no frio, dificilmente terão reserva financeira e passarão por um período de grande dificuldade econômica.

Agora que você já conhece porque agosto costuma ser o mês do desgosto na pesca paranaense, topa ser parte da rede que fortalece o trabalho dessas famílias do nosso litoral?

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A Década dos Oceanos (2021-2030): por que não falamos dela?

ODS 14 e Década dos Oceanos

Faltando 7 anos para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aproveito para trazer uma breve análise de uma das ODS que hoje a Olha o Peixe tem maior contribuição, além de estar intimamente relacionada à formação da nossa equipe, em maioria Oceanógrafos e Oceanógrafas: a ODS 14 - Vida na Água, que trata da "Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável"

As metas associadas a esse Objetivo (confira aqui) abrangem:

- Redução da poluição marinha
- Gestão sustentável dos ecossistemas marinhos e costeiros
- Redução dos impactos da acidicação dos oceanos
- Pesca sustentável e regularizada
- Criação de áreas marinhas protegidas
- Aumentar o conhecimento científico em tecnologia marinha
- Fortalecer o acesso e o mercado da pesca artesanal (ONDE PRINCIPALMENTE ATUAMOS)
- Criação de políticas públicas para conservação dos oceanos e uso sustentável de seus recursos

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Os desafios não só para o Brasil, como para os demais países é complexo, mas possível. E devemos entender a pertinência desses temas e urgência de uma atuação, seja como indivíduos, instituições ou governos. Pois nós mesmos sentiremos o impacto da falta de ação e engajamento em prol dos oceanos.

E por todo esse cenário problemático e carência de ações concretas, 2021 a 2030 foi declarado pela ONU como a Década dos Oceanos, mas você já tinha ouvido falar disso?

Ou melhor, vê com constância na televisão, internet ou jornal o tema?
Na sua opinião, porque falamos pouco sobre os oceanos e sobre a Década, mesmo grande parte da população brasileira vivendo em região costeira?

Se analisarmos ainda como o Brasil conduz os esforços em relação a ODS 14, o cenário é ainda mais preocupante: temos hoje apenas 10 indicadores criados para monitoramento dos avanços em relação às metas estabelecidas para ela. Dos mesmos, temos 5 deles sem dados no país para análise, 2 em análise/construção e somente 3 produzidos e tendo monitoramento. São eles:

- Número de países com progressos na ratificação, aceitação e implementação, através de quadros legais, políticos e institucionais, de instrumentos relacionados com o oceano que implementam o direito internacional, tal como refletido na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, para a conservação e uso sustentável dos oceanos e seus recursos: Em análise/construção

- Progresso dos países relativamente ao grau de aplicação de uma estrutura (enquadramento) legal/ regulamentar/político e institucional que reconheça e proteja os direitos de acesso dos pescadores de pequena escala: Produzido

- Proporção do total do orçamento de pesquisas alocado para pesquisas na área da tecnologia marinha: Em análise/construção

- Pesca sustentável como uma proporção do Produto Interno Bruto (PIB) de pequenos Estados insulares em desenvolvimento, (Small Islands Developing States), de países menos desenvolvidos e todos os países: Sem dados

- Progresso dos países, relativamente ao grau de implementação dos instrumentos internacionais visando o combate da pesca ilegal, não registrada (declarada) e não regulamentada (IUU fishing): Produzido

- Cobertura de áreas marinhas protegidas em relação às áreas marinhas: Produzido

- Proporção da população de peixes (fish stocks) dentro de níveis biologicamente sustentáveis: Sem dados

- Acidez média marinha (pH) medida num conjunto representativo de estações de coleta: Sem dados

- Número de países que utilizam abordagens baseadas em ecossistemas para gerenciar áreas marinhas: Sem dados

- Índice de eutrofização costeira; e (b) densidade de detritos plásticos: Sem dados

Analisando tais indicadores e a carência atual de avanços, percebemos que apesar da costa de dimensão continental do Brasil, nem o fato de estarmos na Década dos Oceanos trouxe até o momento resultados significativos para a sustentabilidade dos oceanos.

Precisamos urgente de uma lei do mar e um regramento participativo da pesca, que envolva e represente as comunidades pesqueiras, e esteja adequado à heterogeneidade de culturas, conhecimentos, práticas e condições ecossistêmicas.

Precisamos de instrumentos, políticas públicas e mecanismos para que governos e instituições priorizem as compras de produtos da pesca artesanal, com o intuito de reduzir desigualdades e promover justiça social.

Precisamos de um Instituto do Mar/dos Oceanos, com estrutura e corpo técnico capaz de monitorar nossa costa, produzir estatística pesqueira e chancelar certificação de pescarias que seguem boas práticas e são mais sustentáveis, já que hoje não há como falar de sustentabilidade pesqueira sem dados pesqueiros consistentes que confirmem conclusões.

Precisamos de mais unidades de conservação marinhas, desde que com envolvimento da sociedade e participação das comunidades pesqueiras que afetadas, para aliar conservação e tradição, preservando nossa fauna, flora, ambientes e culturas.

Precisamos de políticas efetivas para a redução na produção, uso e descarte de plásticos e outros poluentes aos oceanos, com esforços para engajamento da sociedade.

Precisamos, sobretudo, que tais temas sejam mais falados e divulgados. Que a saúde dos oceanos seja tema de conversa entre amigos, seja diariamente abordada na grande mídia. Que tenhamos mais programas, filmes e matérias sobre a costa brasileira, que conectemos universidades e seu conhecimento técnico com a população por meio de linguagem acessível, que a gente possa dar o mesmo peso das comunidades indígenas e quilombolas às comunidades pesqueiras e que, quem sabe, possamos demarcar os territórios e maretórios.

E que possamos, enfim, ver os 10 indicadores produzidos, com dados, mas também com resultados efetivos na mudança de hábitos, na gestão sustentável, no exemplo do Brasil como país que entende a importância das águas que banham sua costa.

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REFERÊNCIAS:

ONU Brasil - https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/14

ODS Brasil - https://odsbrasil.gov.br/relatorio/sintese